quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

A banalização dos bailes


A cada baile que participo me convenço de que todo baile é igual, todas as personagens são iguais, conjuntos musicais semelhantes, repertório de músicas equivalentes e o modelo de organização parecido. O que muda, talvez, é a ornamentação. Ouso dizer que até mesmo o cardápio tem muitos detalhes copiados. Enfim, não consigo enxergar diferença entre um baile ou outro. Estive na semana passada no baile carnavalesco da Bagunça do Circo, e percebi diferenças interessantes em se tratando de um baile carnavalesco com um público diferenciado.

Já percebi, seja em formatura, casamentos, aniversários “solenes”, e eventos de grande exibição, de que o pessoal envolvido diretamente investe em roupas e demais preparativos, utilizando-se de muitas horas na preparação com detalhes que muitas vezes passam despercebidos. Início do evento sempre tudo lindo, tranqüilo e agradável. Num determinado momento, atingimos a parte da refeição que sempre causa certo tumulto, principalmente com as filas intermináveis em que temos que ficar em pé com o prato vazio na mão esperando a nossa vez, mas depois disso é tudo igual... vira tumulto, desorganização e momentos de pura exaltação. Penso que seja nesse momento que o baile se torna banalizado, afinal, homens e mulheres que chegaram todos “engomadinhos”, passam por uma transformação total a ponto de homens ficarem só de calças e as mulheres todas desmanchadas, derretidas, bagunçadas: irreconhecíveis de tão horrorosas. Seria a bebida a culpada? A grande intensidade de felicidade que se explode sem saber como e quando?

Nesse momento mistura-se todo e qualquer tipo de ritmo musical, num volume incompreensível, com qualquer tipo de manifestação física diferente de dança. É nesse ponto que acredito no fato de que os “bailes de salão”, deixaram de ter valor e o verdadeiro significado. Se toda e qualquer festa termina em “Carnaval”, ou então em “bailão”, ou então em “tecnodance”, onde está a força de um baile característico? Até os famosos Bailes do Havai, dos Anos Dourados, das Debutantes, ou qualquer outro que tenha um tema...??!!! se tudo vira festa com qualquer ritmo, qualquer melodia, qualquer conjunto musical, qualquer motivo, para que ter o baile disso ou daquilo? Realmente faz sentido os clubes sociais não conseguirem atrair pessoas para bailes tradicionais, pois tudo acaba em “Carnaval”. Este baile ficou banal.

O Baile da Bagunça do Circo se fortalece por combater tudo isso, ou seja, se mantém firme aos princípios do baile em si. Estive no baile quando era no salão do Marília Tênis Clube e estive no Golden Palace. Mantiveram as características temáticas e melhoraram a recepção e principalmente a segurança. Essa é a força deste baile, pois, em momento algum ouvi outro tipo de música a não ser carnavalesca, e não aché, sertanejo, clássicos ou qualquer outro tipo. O pouco que tocaram fora do ritmo das tradicionais marchinhas inocentes, percebeu-se nitidamente o esvaziamento das pessoas no centro do salão. Até mesmo com a apresentação de uma escola de samba da cidade, ficou claro que o desejo da maioria era o saudosismo e as marchinhas.

Sempre quando vou a um baile desses em que tudo vira nada, digo que até o momento da refeição é possível aproveitar para conversar, rever amigos, matar a saudade com pessoas distantes, ouvir e ver o que as pessoas falam e mostram e ter momentos agradáveis. Depois do jantar resume-se em barulho, escuridão, desorganização e demonstração de comportamentos pessoais nada normais, convidativos para que nos recolhemos para casa, com dor de cabeça, de ouvido e muitas vezes com fome. Lamento que o tempo até a “sessão desmanche” seja pouco. Poderíamos criar uma situação para estender mais este período e diminuir o “desmanche”. Venho notando que a “sessão descarrego”, tem conseguido mais espaço nos eventos a ponto, inclusive, de distribuírem “badulaques” que não consigo entender pra que?

Talvez o peso de quase meio século de vida esteja me fazendo ver a coisa desse ângulo, mas não posso deixar de registrar o ambiente gostoso proporcionado pelo pessoal da Chácara O Circo, que promove este evento há anos e a cada edição tem ficado melhor. Realmente foi um autêntico Baile de Carnaval, com fantasias, blocos carnavalescos, pessoas de maior idade, sem álcool, sem confusão, puro momento de muita saudade. Naturalmente os jovens não gostam e nem lá estiveram para notar a diferença.

Da mesma forma que passei a freqüentar o Carnaval de Rua, com os desfiles em escolas de samba, passarei a freqüentar o Baile do Circo, mas da próxima vez irei fantasiado, pois, fiquei frustrado de não ter brincado a noite toda num típico e verdadeiro baile de Carnaval, com a mulher que amo, sem a sessão desmanche ou descarrego. Parabéns aos organizadores que não deixam a tradição acabar e que revitalizam os sonhos dos mais antigos em relembrar tempos que não voltam mais, mas que neste tipo de baile promovido pela Chácara O Circo nos remete a momentos prazeirosos. 

2 comentários:

  1. Ótimo artigo, Márcio. É contagiante a alegria do pessoal na Bagunça do Circo. Vi alguns trechos na TV, e as fotos nos jornais.
    Pena que "cheguei um pouco atrasado". Na minha época, os bailes de Carnaval no Yara e Bancários já estavam acabando.
    E o que tinha, como você bem disse, eram bandas que tocavam as mesmas músicas que ouvíamos nas casas noturnas em qualquer outro final de semana. Então, não tinha quase nada de novo. Perdi logo o interesse.
    É difícil gostar do que não se conhece, então, não posso dizer se gosto das Marchinhas, e assim, não gosto do Carnaval.
    Quanto ao Carnaval de Rua, agradeço ao Poder Municipal por der cancelado o deste ano. Aquilo que eu via em Marília me feria como uma "vergonha alheia". Era constrangedor ! Talvez sair num bloco de amigos, como o do Circo, seja mais agradável, mas me contento em ver a alegria dos que estão se divertindo.
    Bem, não fui neste baile no Golden este ano, e certamente não irei ano que vem, mas desejo a você e aos demais foliões, uma grande diversão, e parabéns pela organização.
    Quando meus amigos do exterior me perguntavam sobre o Carnaval, eu sempre dizia "é coisa para turistas". Agora, acho que terei mais para contar.

    Abraços.

    ResponderExcluir
  2. Caro Márcio, sou nascido carioca, agora Rio Pretense por quase 25 anos. Na adolescência me estranhava a postura de observador da massa pululante, sem reconhecer o sentido, alheio à música carnavalesca que inundava os ouvidos. Hoje reconheço-me um observador, muitas vezes "alheio" ao ambiente. Claro que há 50 anos atrás o mundo e a sociedade eram muito diferentes. O desenvolvimento vertiginoso da tecnologia e o aparelhamento dos humanos nos propiciaram imenso conforto e potencial. Por outro lado, nos tornaram mais preguiçosos e arrogantes. O oposto da tecnologia é a crítica. Palavra de raízes greco-latinas que se mistura a análise e julgamento. Ambos envolvem conhecimento e reflexão, atos proscritos numa sociedade "pasteurizada" e "higienizada" por padrões de propaganda massificadora onde a diferença é estigmatizada até o "bulling".
    O que tudo isso tem com baile de carnaval? O non-sense de vencer o ridículo de pular de alegria quando se está triste ou reflexivo. O impor-se uma anulação da consciência de vida, das responsabilidades, do tempo tão escasso, em meio ao imediatismo tecnológico... Talvez explique porque após anestesiarem suas consciências, os egos liberados caiam na fúria competitiva da exibição desenfreada que caracterizam a mesmice das "festas" atuais tão bem salientada em sua reflexão. Obrigado pelo espaço e oportunidade para praticarmos crítica ainda que considerados velhos, sistemáticos e chatos como o são os profissionais dessa área. Abraco

    ResponderExcluir

Seja responsável por suas colocações.